agosto 15, 2025

Prefeitura de SP reorganiza Samu, e médicos temem que serviço perca rapidez

Há um mês, a prefeitura de São Paulo começou a realocar bases de onde partem as ambulâncias do Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência), sob o argumento de ampliar o número de postos. Mas os médicos dizem que os locais escolhidos têm problemas de acesso e colocam em risco a agilidade nas saídas — o que é indesejado para os resgates.

Em protesto, médicos, enfermeiros e outros funcionários do Samu anunciaram uma paralisação para a segunda-feira (1º) — data estipulada para o fechamento definitivo de 31 das 58 bases do serviço.

Um médico do Samu disse à reportagem, sob condição de anonimato, que cerca de 10% da categoria deve aderir à paralisação, e o atendimento não deve ser prejudicado. Os profissionais têm medo de se identificar por temerem retaliações da prefeitura.

A Secretaria Municipal de Saúde diz que as críticas ao processo de reestruturação do Samu “interessam somente a quem privilegia interesses particulares em detrimento dos interesses da coletividade”.

Mudanças

A reestruturação vai fechar as chamadas “bases modulares” – contêineres instalados em terrenos que abrigam as equipes. Segundo a prefeitura, novas bases serão abertas e chegarão a 78 até 2020. Os profissionais que atuavam nas bases modulares estão sendo transferidos para salas em hospitais e outras unidades de saúde.

Os médicos, porém, dizem que os novos locais não oferecem condições logísticas para a operação.

“Um hospital não é um lugar apropriado para se ter essas bases, o local dificulta a operação das ambulâncias. Nas bases, as ambulâncias ficam posicionadas em frente ao portão para saírem o mais rápido possível”, disse à reportagem um médico que trabalha há mais de 20 anos no Samu.

“Quando se trata de salvar uma vida, cada segundo é importante. No entorno do hospital, a ambulância se depara com um carro que está levando um paciente idoso, ou uma pessoa que acabou de ser imobilizada. Não é próprio para a agilidade que a ambulância precisa ter”, argumenta.

Base do Samu no Pronto Socorro Bandeirantes, no Butantã; médicos e enfermeiros criticam estrutura precária e insalubre Imagem: Reprodução

Vídeos e fotografias obtidos pelo UOL mostram algumas dessas situações.

Uma das gravações exibe uma ambulância com dificuldades para sair do estacionamento do Pronto-socorro Municipal Bandeirantes, no Butantã. A equipe do Samu não conseguiu socorrer um paciente que sofria uma parada cardiorrespiratória.

“A saída do hospital estava congestionada. Demoraram 15 minutos para conseguirem sair do estacionamento”, disse o médico do Samu à reportagem.

Os profissionais dizem que as bases que serão fechadas estão próximas aos locais que registram grande volume de solicitações de atendimento e afirmam que esse planejamento foi ignorado pela reestruturação. A prefeitura nega.

“Vão ser menos ambulâncias atendendo mais longe das ocorrências”, diz Gerson Salvador, diretor do Simesp (Sindicato dos Médicos de São Paulo), em nota enviada à reportagem.

O maior tempo de espera poderá resultar em mortes. A economia do município não deveria custar a vida das pessoasGerson Salvador, diretor do Simesp

Insalubridade

Nova base do Samu no Hospital Municipal do Campo Limpo, zona sul de São Paulo   Reprodução   Reprodução Nova base do Samu no Hospital Municipal do Campo Limpo, zona sul de São Paulo Imagem: Reprodução Os profissionais também reclamam das condições dos novos locais de trabalho — muitas vezes, salas ociosas em hospitais com estrutura precária.

As bases modulares que estão sendo fechadas têm quartos, banheiros com vestiários, cozinha, salas para refeições, locais específicos para limpeza e esterilização da ambulância e dos funcionários, almoxarifado e uma área administrativa.

Os locais para onde estão sendo transferidos, segundo os funcionários, não têm espaço adequado nem para a esterilização e limpeza dos veículos, que muitas vezes retornam das emergências com vestígios de sangue, vômito e outras secreções.

Na base do Hospital Municipal Campo Limpo, zona sul de São Paulo, os funcionários do Samu passaram a dividir banheiro com os seguranças do hospital e não há local para banho.”Isso pode infectar o próximo paciente”, diz outro médico do serviço ao UOL, também sob condição de anonimato.

Segundo os médicos, de 2 mil ocorrências registradas na cidade por dia, apenas 700 conseguem ser atendidas.

“Falta braço, não estamos contentes com essa situação. Precisaríamos dobrar a estrutura de hoje. Essas mudanças que a prefeitura pretende fazer devem piorar ainda mais essa situação”, diz. “O prefeito Bruno Covas (PSDB), no fundo, quer terceirizar a atividade-fim do Samu. Ele quer jogar o Samu na gestão das OS [Organizações Sociais]”.

Base modular do Samu no Jardim Ângela, que será fechada pela prefeitura, amanheceu na última quarta feira (27) com uma faixa de protesto   Reprodução   Reprodução Base modular do Samu no Jardim Ângela, que será fechada pela prefeitura, amanheceu na última quarta-feira (27) com uma faixa de protesto Imagem: Reprodução

O Sindicato dos Médicos diz que, com o fim das bases modulares, a prefeitura quer economizar R$ 7,4 milhões ao ano. Cada base, segundo levantamento do órgão, custa cerca de R$ 20 mil por mês ao município. Procurada, a prefeitura não informou, até a conclusão da reportagem, os custos relacionados às bases modulares.

O que diz a prefeitura

Segundo a secretaria de Saúde, as mudanças feitas na estrutura do Samu não têm objetivo econômico. O intuito é aumentar o número de bases e de profissionais.

“A descentralização vai ampliar o número de bases das atuais 58 para 78. Com mais bases, aumenta a capilaridade do serviço. Mais capilaridade aproxima as ambulâncias e equipes de socorro dos locais de ocorrência, diminuindo o tempo de resposta aos chamados. Portanto, a ampliação dos pontos de apoio aumenta a cobertura do território, e não o contrário”, afirmou a secretaria.